Pesquisas revelam presença de micro e nanoplásticos em alimentos, ar e água

Os riscos que os micro e nanoplásticos podem trazer à saúde humana ainda não estão totalmente comprovados, mas a presença dessas partículas no meio ambiente e no corpo já é inquestionável. É o que revela uma pesquisa realizada por cientistas da Universidade Federal Fluminense (UFF), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

O trabalho reuniu e avaliou 140 estudos desenvolvidos em vários países, entre eles o Brasil. De acordo com o professor Vitor Ferreira, do Instituto de Química da UFF, embora os impactos ambientais do plástico sejam conhecidos há décadas, o olhar mais atento sobre partículas microscópicas e suas possíveis interações com organismos vivos só começou a se consolidar nos últimos anos.

“Esse material não se desfaz de maneira natural. Com o tempo, a radiação solar faz com que ele se fragmente em pedaços cada vez menores, transformando-se em micro e nanoplásticos. Essas partículas acabam no solo, na atmosfera e na água, e entram na cadeia alimentar. Até mesmo a água potável apresenta sinais dessa contaminação”, afirma Ferreira. A investigação contou com apoio da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

As análises apontaram a presença dessas partículas em itens comuns da alimentação, como mel, açúcar e sal. Os frutos do mar também figuram entre as principais fontes de ingestão, já que filtram ou consomem resíduos plásticos e, em seguida, os transmitem a outros animais e aos humanos.

O problema já foi identificado em diferentes biomas brasileiros, indo da Amazônia até o Rio Grande do Sul. Além de ingeridos, os micro e nanoplásticos também podem ser inalados ou absorvidos pela pele.

Estudos estimam que uma pessoa ingira entre 39 mil e 52 mil partículas por ano — número que pode ultrapassar 120 mil quando considerada a respiração. Indivíduos que consomem somente água engarrafada podem chegar a ingerir quase 90 mil microplásticos adicionais. No entanto, os especialistas destacam que esses números tendem a ser ainda maiores, uma vez que os nanoplásticos, menores e mais difíceis de identificar, frequentemente escapam das técnicas tradicionais de análise.

Depois de entrar no organismo, essas partículas podem se acumular em diferentes locais, como pulmões, boca, corrente sanguínea, tecidos e órgãos. Pesquisas recentes já detectaram a presença de microplásticos em placentas e cordões umbilicais, mostrando que até fetos podem ser expostos.

O desafio agora é comprovar de forma definitiva os efeitos desse contato na saúde. “Existe apenas um estudo clínico que avaliou coágulos em artérias e encontrou microplásticos em 60% deles. É possível que tenham contribuído para sua formação, mas ainda falta estabelecer essa relação direta”, afirma Ferreira.

O professor lembra que o termo “plástico” engloba diversos polímeros produzidos a partir do petróleo. Apesar de serem mais lembrados em embalagens, esses materiais também estão em roupas, pneus e inúmeros objetos de uso diário. Além disso, é preciso considerar os aditivos químicos utilizados em sua fabricação.

Para Ferreira, a mitigação da poluição plástica precisa ser tratada como prioridade. “É essencial investir em sistemas de reciclagem e evitar que mais resíduos sejam descartados no ambiente. Isso exige mudanças individuais, mas, principalmente, políticas públicas e responsabilidade das indústrias”, ressalta.

Ele lembra ainda que, desde 2022, a Organização das Nações Unidas (ONU) discute um tratado global para enfrentar a poluição plástica. No entanto, as negociações entre os países já foram adiadas duas vezes.

© Fernando Frazão

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