Consciência ambiental avança em regiões com iniciativas contínuas de conservação

Uma pesquisa recente mostra que comunidades que convivem por longos períodos com projetos de conservação tendem a apresentar níveis significativamente mais altos de percepção ambiental. O levantamento, conduzido pelo Programa Maré de Ciência, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), em parceria com a Rede Biomar, indica que a presença de ações permanentes pode elevar em até 20% a compreensão da população sobre temas relacionados ao oceano e ao meio ambiente.

O estudo, realizado em maio com 1.803 moradores de municípios costeiros, comparou dois grupos: pessoas que conhecem pelo menos um dos cinco projetos da Rede Biomar (Albatroz, Baleia Jubarte, Coral Vivo, Golfinho Rotador e Meros do Brasil) e um grupo controle que não tem contato com nenhuma dessas iniciativas. Os resultados revelam que projetos com mais de duas décadas de atuação não apenas ampliam o vínculo das pessoas com o oceano, como fortalecem atitudes de responsabilidade ambiental.

Impacto direto no comportamento

Segundo os dados, aqueles que têm contato com a Rede Biomar apresentam um entendimento 11% maior sobre como o oceano influencia o cotidiano e demonstram interesse mais ativo em buscar informações sobre o tema. Entre esses, 88% afirmam procurar conteúdos relacionados ao ambiente marinho, índice 23% superior ao público que não conhece os projetos. A disposição para colaborar com a conservação também se revela maior: 87% dizem sentir motivação para contribuir, enquanto no grupo controle esse número cai para 13%.

A pesquisa mostra ainda que 82% das pessoas familiarizadas com a Rede Biomar estão dispostas a modificar hábitos para proteger o oceano, e quase metade se declara extremamente disposta a isso. Mais de 90% se veem como potenciais agentes de transformação em suas comunidades, percentual superior ao observado entre aqueles que desconhecem as iniciativas.

Ferramenta estratégica

O estudo integra o planejamento da Rede Biomar para a Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável, promovida pela Organização das Nações Unidas. Para Tatiana Neves, fundadora do Projeto Albatroz, os resultados oferecem uma leitura clara do alcance das ações e são fundamentais para direcionar novos esforços. Ela ressalta que a pesquisa não apenas confirma o impacto já percebido em campo, como orienta ajustes que podem tornar a comunicação e o engajamento mais eficazes.

O coordenador do Programa Maré de Ciência, Ronaldo Christofoletti, destaca que os números reforçam a importância da educação ambiental contínua. Ele lembra que transformações de percepção e comportamento acontecem de maneira gradual, especialmente quando envolvem temas complexos como o oceano e a mudança do clima.

Da consciência à ação

Os pesquisadores apontam, porém, um desafio comum: embora a população demonstre crescente preocupação com o meio ambiente, ainda há insegurança sobre quais atitudes adotar. Muitas pessoas querem contribuir, mas não sabem por onde começar. Segundo Tatiana Neves, esse é um ponto central para os próximos anos, que exigirá estratégias educativas mais claras, práticas e adaptadas às diferentes realidades locais.

Reduzir o consumo de plástico descartável, preferir produtos de menor impacto ambiental e participar de ações comunitárias são algumas das práticas identificadas como caminhos possíveis. A Rede Biomar planeja reforçar esse tipo de orientação, aproximando a conservação marinha do cotidiano da população.

Educação adaptada a cada contexto

O estudo também demonstra a necessidade de ajustar abordagens pedagógicas para diferentes perfis sociais e faixas etárias. Ronaldo Christofoletti observa que a conscientização só é efetiva quando o conhecimento se relaciona com a vivência concreta das pessoas. Ele defende uma construção coletiva de soluções, em que comunidades participem da definição das prioridades e das estratégias adotadas.

Responsabilidade compartilhada

Um dos obstáculos identificados é a ideia de que cabe exclusivamente ao poder público resolver questões ambientais. Para Tatiana Neves, esse distanciamento enfraquece a sensação de responsabilidade individual e dificulta a mudança de comportamento. Ela defende maior envolvimento de empresas, governos e instituições no fortalecimento de ações educativas contínuas.

A pesquisa reforça a relevância de investimentos de longo prazo, que permitam continuidade e aprofundamento das ações. A Rede Biomar, que conta com o patrocínio da Petrobras, é citada como exemplo de iniciativa que mantém atuação constante ao longo dos anos, gerando efeitos perceptíveis na formação de uma cultura oceânica.

Um novo olhar sobre o oceano

Christofoletti lembra que políticas públicas desempenham papel decisivo nesse processo. Ele cita o Currículo Azul, política em construção no Brasil que integra a educação oceânica ao ensino básico. A proposta busca apresentar às novas gerações a relação entre oceanos, biomas terrestres, clima e modos de vida, formando cidadãos mais preparados para lidar com desafios ambientais.

Segundo ele, iniciativas como essa devem abranger todas as etapas escolares, desde a educação infantil ao ensino superior, fortalecendo uma compreensão ampla sobre conservação e sustentabilidade.

Rede Biomar e Maré de Ciência

Criada em 2007, a Rede Biomar reúne projetos dedicados à pesquisa, conservação e educação ambiental em diferentes pontos do litoral brasileiro, com foco em espécies e ecossistemas estratégicos. A longevidade e a atuação integrada são apontadas como elementos centrais para o avanço da consciência ambiental nas regiões onde a rede está presente.

O Programa Maré de Ciência, criado em 2012 pela Unifesp, atua na popularização da ciência e na promoção de iniciativas educativas que aproximam população, escolas, governos e setor produtivo do universo marinho. As ações buscam ampliar o entendimento sobre o oceano, fortalecer políticas de conservação e estimular práticas sustentáveis capazes de contribuir para a resiliência climática.

Imagem: Fernando Frazão

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